19 August 2009

Sorri para mim

1st
Chamam-lhe zumbido. Mas a mim não me enganam. São gritos, gritos que chegam e não se vão embora. Por favor matem-me, dizem eles. E chocam contra mim na minha velocidade. Por favor. Entram pelas pernas, pelos ouvidos, pelos olhos, embrenham-se no cabelo, sugam os meus braços, forçam a minha boca a fechar-se. Mas, na realidade, são eles que gritam. O seu som e mais forte que o meu. Eles não me deixam gritar, tapam-me a boca.

2nd
Mas agora quero gritar, explodir. Quero guiar, segurar firmemente a corda amarela e verde que me prende. Deixar-me cair. Sentir que a minha boca, os meus olhos, os meus ouvidos fecharam-se, agora por um bom motivo. Olhar em frente e ver que já não está lá. Veio de trás para me buscar. Aí sim, abro a boca para dizer algo estúpido. Mais valia estar calada. Mas eu quero gritar. Quero explodir de… de…de…. Salvem-me, estou a afogar-me.

5th
Zzzzz…plash. Zzzzz…plash! Debaixo de mim já ninguém me encontra. Fecham-se os cortinados e cobertores. Grita a meio da noite e lembra-me que ainda posso engolir mais zumbidos, que ainda posso olhar, contemplar, agarrar. Mas está demasiado longe, de costas para mim. Zzzzz…plash! Sim, está morto.

17th
Vem. Vem. Sai daqui. Deixa-me olhar para cima onde ainda posso distinguir luz. Ah, sim. Só vejo luz. Mas está frio. Cobre-me, porque és branco. Mas só por isso. Deixa-me sentir que estou em casa, deixa-me ouvir o Espírito que esta terra emana. Ainda consigo imaginar-me sentada naquela varanda, naquela noite, sem sequer me atrever a traduzir o céu. Apetecia-me chorar. Apetecia-me morrer de tanto rir. Apetecia-me apetecer voltar. Mas não quero, tu sabes. Acalmei-me já. Esse foi o meu desejo: um dia retornar a este céu, tão diferente do meu, tão mais livre e amplo. Tão mais céu, tão mais meu.

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